Análise da divisibilidade do objeto e da possibilidade de padronização
Uma incompatibilidade na utilização do sistema de registro de preços nos casos de obras, serviços de engenharia a outros serviços em geral pode se fazer presente em função da natureza do objeto da licitação, caso que demanda conhecimentos técnicos para avaliação. Nesse sentido, vejamos o seguinte trecho de decisão do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, enfrentando o tema na Consulta nº 732.557:
A regulamentação municipal do sistema de registro de preços poderá incluir a execução de obras e serviços comuns de engenharia, desde que satisfeitos os critérios de divisibilidade do objeto, imprevisibilidade da demanda e que esta seja repetida e rotineira para Administração Pública, observados, ainda, os princípios que regem as licitações.
TCE/MG. Consulta nº 732.557. Relator Conselheiro Eduardo Carone. Sessão do dia 11/06/2008. Tribunal Pleno.
Dessa forma, o TCE/MG leva em consideração os critérios de divisibilidade do objeto, a fim de verificar a possibilidade de utilização do sistema de registro de preços para serviços comuns de engenharia. Assim, no caso da adoção do sistema de registro de preços, não se trata apenas de ser um serviço comum – exigência para a utilização do pregão –, devendo o objeto atender a critérios de divisibilidade e padronização.
O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, tratando dessa temática, editou o enunciado de Súmula nº 32, que dispõe:
SÚMULA Nº 32 – Em procedimento licitatório, é vedada a utilização do sistema de registro de preços para contratação de obras e serviços de engenharia, exceto aqueles considerados como de pequenos reparos.
Súmula 32, TCE/SP
Nesse sentido, em exame de edital que visava o registro de preços para prestação de serviços de recuperação, conservação e manutenção de vias públicas, bem como serviços complementares, o TCE/SP, seguindo orientação de sua Assessoria Técnico-Jurídica, considerou que os serviços descritos no processo não poderiam ser considerados como aqueles de pequenos reparos, impossibilitando a utilização do sistema de registro de preços, nos termos da Súmula nº 32 daquela Casa[10].
A Consultoria Zênite, nessa seara, opina pela necessidade de individualização dos objetos e padronização da solução para a utilização do registro de preços[11]:
Nesses moldes, a instituição de ata de registro de preços se mostra adequada para aqueles objetos que possam ser individualizados por meio de descrição clara e uniforme. Sua aplicação requer a padronização da solução a ser contratada, ou seja, o objeto não poderá sofrer modificações a cada contratação futura que vier a ser celebrada a partir da ata.
Zênite Blog. De acordo com o TCU, é possível contratar obra de engenharia por sistema de registro de preços?
Nessa linha, o TCE/MG entendeu pela incompatibilidade da adoção do sistema de registro de preços para os serviços de iluminação pública. Senão, vejamos:
Na mesma linha de intelecção, a unidade técnica (…) posicionou-se pela incompatibilidade do sistema de registro de preços em face do objeto do certame, ressaltando que esse sistema é aplicado sempre que possível às compras e serviços comuns, dentre os quais não se enquadram os serviços de iluminação pública, que incluem ampliação, modificação, distribuição e manutenção de rede elétrica, envolvendo diversas peculiaridades e complexidade técnica. Além disso, asseverou-se que consta nos autos planilha orçamentária na qual estão especificadas as quantidades em unidades referenciais dos serviços a serem executados, o que reforça a idéia da inadequação do SRP, posto que ausente o requisito referente à imprevisibilidade da demanda. (…)
Destarte, verifico que o objeto licitado não possui demanda imprevisível, já que o quantitativo mínimo foi definido no edital (…)
Também não foi cumprido o requisito referente à divisibilidade do objeto, pois não há demanda por itens isolados, considerando que a contratação se compõe de serviços de infraestrutura urbana em complexo de obras e serviços, com a elaboração de projetos executivos, fornecimento dos materiais necessários e mão de obra qualificada (…)
TCE/MG. Denúncia nº 959038. Relator Conselheiro Substituto Hamilton Coelho. Primeira Câmara – 13ª Sessão Ordinária – 23/04/2019.
O TCE/MG, na Denúncia nº 1058543, do ano de 2018, decidiu pela suspensão liminar de um certame, do Município de Ribeirão das Neves, que visava a contratação de serviços de urbanização de vias, compreendendo rede de drenagem pluvial, contenção, terraplanagem, pavimentação poliédrica, gabião, tapa buraco e obras complementares ao município.
Dentre outros fundamentos para a suspensão, foi considerada a adoção do sistema de registro de preços e o critério de julgamento menor valor global em desconformidade com o entendimento daquela relatoria. O Tribunal também destacou a impossibilidade de se verem padronizados os serviços de engenharia necessários à execução do objeto[14].
Tratando dessa temática, já decidiu o TCE/MG que
No edital, os itens licitados não podem ser indicados por unidades genéricas que não representam índices de produtividade dos serviços, conforme se depreende da Súmula n. 258 do Tribunal de Contas da União[15].
[15] TCE/MG. Denúncia 1024681. Conselheiro Wanderley Ávila. 33ª Sessão Ordinária da Segunda Câmara. 09/11/2017.
Nesse sentido, do Edital da licitação e das propostas dos licitantes, devem constar, inclusive, as composições de custos unitários, o detalhamento de encargos sociais e o BDI, que integram o orçamento que compõe o projeto básico da obra ou serviço de engenharia.
Nesse cenário, tendo em vista se tratar de características do objeto, inclusive, com grande nível de especialização, a avaliação desse ponto depende de apreciação de ordem técnica, se limitando o advogado público a indicar os limites dos caminhos jurídicos. As escolhas da Administração devem ser avaliadas com base em estudos prévios, a fim de que a Administração defina a solução que melhor atenda ao interesse público, levando em conta as características do caso concreto, a fim de garantir a economicidade, a vantajosidade e se precaver contra futuras assimetrias de informações que poderá ter, com relação ao futuro contratado.
Nesse sentido, destacamos que a Consultoria Zênite, também considerando que apenas os serviços comuns de engenharia podem ser contratados por registro de preços e desde que envolvam a execução de atividade de pouca relevância material, simples e típicas de intervenções isoladas, com natureza padronizável e pouco complexa, informa que é recomendável a existência de parecer técnico emitido pela área de engenharia responsável pela contratação, ratificando a decisão da Administração[16].
Buscando parametrizar a temática, a Lei nº 14.133/2021 destacou, no art. 85, que:
Art. 85. A Administração poderá contratar a execução de obras e serviços de engenharia pelo sistema de registro de preços, desde que atendidos os seguintes requisitos:
I – existência de projeto padronizado, sem complexidade técnica e operacional;
II – necessidade permanente ou frequente de obra ou serviço a ser contratado.
E aqui, vale destacar, a diferença entre o conceito de bem ou serviço comum e objeto padronizado.