Inversão da ordem das fases nas licitações, art. 17, da Lei nº 14.133/2021 e o entendimento do STF

Ordem das fases nas licitações sob a égide da Lei nº 8.666/93 e da Lei nº 10.520/02

Inicialmente, antes da regulamentação da modalidade pregão, as licitações, em geral, poderiam adotar as modalidades de tomada de preços e concorrência, nas quais, a Lei nº 8.666/93, previa apenas uma ordem para as fases do procedimento.

Nesse sentido, inicialmente ocorreria a fase de habilitação (art. 43, I, Lei nº 8.666/93) e, posteriormente, a análise das propostas (art. 43, III, Lei nº 8.666/93).

Com a regulamentação do pregão, primeiro no Decreto Federal nº 3.555/2000 e, em seguida, por meio da Lei nº 10.520/02, vislumbrou-se a chegada de uma modalidade de licitação na qual tais fases eram invertidas: primeiro se verificam as propostas (art. 4º, VII, Lei nº 10.520/02) e, posteriormente, se analisa a habilitação do licitante que ficou em primeiro lugar (art. 4º, XII, Lei nº 10.520/02).

Tais ordens, contudo, eram estanques em função da modalidade adotada. Ou seja, caso se utilizasse tomada de preços ou concorrência, a ordem seria habilitação e, depois, análise das propostas. Caso se optasse pelo pregão, primeiramente teríamos a análise das propostas e, depois, a habilitação.

Inversão de fases na Lei nº 14.133/2021

A alteração de fases foi sendo abordada em leis que vieram posteriormente regulamentando o tema das licitações e contratos, como a Lei das PPPs (Lei nº 11.079/2004) e a Lei do RDC (Lei nº 12.462/2011).

Com o advento da Lei nº 14.133/2021, a ordem das fases das licitações foi definida de forma uniforme, independentemente da modalidade adotada. Nesse sentido, o art. 17 assim definiu:

Art. 17. O processo de licitação observará as seguintes fases, em sequência:

I – preparatória;

II – de divulgação do edital de licitação;

III – de apresentação de propostas e lances, quando for o caso;

IV – de julgamento;

V – de habilitação;

VI – recursal;

VII – de homologação.

Dessa forma, observa-se que primeiro se analisam as propostas, para, posteriormente, se verificar a habilitação.

Nota-se, porém, que o §1º trouxe a possibilidade de inversão de tais fases, se fundamentado em ato motivado, com explicitação dos benefícios decorrentes e desde que expressamente previsto no edital. O dispositivo assim informa:

§ 1º A fase referida no inciso V do caput deste artigo poderá, mediante ato motivado com explicitação dos benefícios decorrentes, anteceder as fases referidas nos incisos III e IV do caput deste artigo, desde que expressamente previsto no edital de licitação.

Assim, a NLLC, além de unificar a ordem das fases, unifica a possibilidade de inversão de tais fases, independentemente da modalidade adotada, caso tal inversão resulte em benefícios.

Era possível lei estadual, distrital ou municipal regulamentar outra ordem de fases ainda sob a égide da Lei nº 8.666/93?

Em decisão de 27/05/2024, o STF entendeu ser constitucional lei distrital que adotou procedimento licitatório cuna ordem das fases era diversa da prevista na Lei nº 8.666/93.

Nesse julgado, estabeleceu a seguinte tese:

São constitucionai as leis dos Estados, Distrito Federal e Municípios que, no procedimento licitatório, antecipam a fase da apresentação das propostas à da habilitação dos licitantes, em razão da competência dos demais entes federativos de legislar sobre procedimento administrativo.

STF. Plenário. RE 1.188.352/DF. Rel. Min. Luiz Fux. 27/05/2024. Repercussão Geral – Tema 1.036)

Esse julgado é interessante, uma vez que a definição da constitucionalidade ou não de tal norma, nos níveis subnacionais, depende do entendimento se tal norma se enquadra como norma geral de licitação ou não.

Nesse cenário, o STF entendeu que a disciplina da ordem das fases do procedimento, embora estivesse no texto da Lei nº 8.666/93, não possuia natureza de norma geral. A norma que dispõe sobre tal tema, para a Suprema Corte, regula mera disciplina procedimental.

Embora o julgado se refira à questão discutida sob a égide da Lei nº 8.666/93, é interessante conhecer a razão de decidir a fim de vislumbrar, em novos casos concretos, até onde vai a possiblidade de estados, Distrito Federal e municípios, regulamentarem a temática das licitações e contratos.


Sobre a discussão acerca das normas gerais e normas específicas de licitações e contratos, vale a pena ler nosso artigo Repartição de competências e a exigência de licenças e requisitos especíicos nas licitações e contratos: o constante debate acerca da caracterização de normas gerais e normas específicas.

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