Naming rights em bens públicos

Naming rights no mercado brasileiro

Febre no mercado brasileiro de marketing nos últimos anos, o naming rights ou direitos de nomeação, em tradução livre, consiste no direito de nomear um equipamento ou espaço. Muito utilizado em campos de futebol e casas de show, os naming rights têm ultrapassado a nomeação de grandes arenas e passado a incidir em mercados, teatros, parques, praças e até mesmo espaços públicos menores.

O instituto do naming rights é definido pelo jurista Marçal Justen Filho como “o direito de nomear um bem, seja um bem tangível ou um evento, usualmente outorgado em troca de compensação financeira1.

Cada contrato irá possuir regras específicas, seja quanto à duração, contrapartidas e prazos de pagamento, sem falar em eventuais usos do espaço para fazer publicidade dentre outras questões.

Para a marca, a visibilidade é um dos principais benefícios. Alguns desses lugares comportam eventos que são transmitidos online ou pela tv, de forma que ao anunciar o local, lá irá estar o nome da empresa ou do produto que se quer divulgar. Para o dono do imóvel, o principal interesse é o retorno econômico que a exploração do nome pode lhe entregar.

Além disso, pode ficar acordado que nesses espaços irá haver lojas, pontos de vendas ou alguma operação da empresa que busca comprar o naming rights, sem falar na possibilidade de se convencionar obrigações de realizações de melhorias e manutenções no espaço.

De qualquer forma, a cessão dos naming rights não se confunde com a cessão do bem, não havendo nesse caso concessão da posse, nem do direito de gozar ou dispor do bem. O negócio jurídico a ser realizado tem como objeto exclusivamente a atribuição de um nome ao bem.

Naming rights em bens públicos: uma nova possibilidade?

A cessão de naming rights ganhou popularidade a partir da década de 1970, nos Estados Unidos2. Com o passar do tempo, tal prática se disseminou ao redor do mundo, deixando claro que a Administração Pública, proprietária de bens públicos estratégicos, também poderia se beneficiar de tal instituto. Os benefícios se mostram na medida em que o negócio a ser celebrado permite a conversão do uso de um nome, até então inexplorado, em um ativo capaz de gerar receitas. Além disso, a cessão do naming rights não impede o uso normal do bem público.

Recentemente a arena Pacaembú, estádio que, muito embora esteja concedido à iniciativa privada, pertence ao município de São Paulo, negociou os naming rights, por 30 anos, com a empresa Mercado Livre. Noticia-se que tal contrato, que prevê o direito de nome por 30 anos, ultrapassou a cifra de R$ 1 bilhão3.

Também chegou a ser debatido a negociação que estaria em curso entre o município de São Paulo e a empresa PepsiCo, visando renomear o Largo da Batata, na zona oeste da capital, que passaria a se chamar Largo da Batata Ruffles, anunciando a marca da empresa, em troca de repasse financeiro4. Aparentemente, porém, as tratativas não avançaram, em virtude de questões legais.

Nesse cenário, surgem dúvidas, inclusive, quanto à possibilidade jurídica desse tipo de negociação. A utilização de tal instituto pela Administração Pública é constitucional? Deve haver legislação regulamentando o tema?

Quanto ao tema, nota-se que a cidade de São Paulo aprovou a Lei Municipal nº 18.040/2023, que altera a Lei Municipal nº 16.703/2017 e disciplina a cessão onerosa de direito à denominação de equipamentos públicos municipais.

A nova legislação prevê que nas modalidades de desestatização previstas na Lei Municipal nº 16.703/2017, poderá ser prevista a cessão de direito à denominação de equipamentos e serviços municipais. O dispositivo que trata do tema impede que se retire termos do nome original, de forma que o direito à denominação deverá consistir no acréscimo de sufixo após a sua denominação originária.

Outro exemplo é o município de Juara/MT, que também regulamentou o tema, autorizando o Poder Executivo a celebrar contratos de cessão onerosa de direito com a iniciativa privada, visando à nomeção de eventos e equipamentos públicos municipais que desempenhem atividades dirigidas à saúde, cultura, esportes, educação, assistência social, lazer e recreação, meio ambiente, mobilidade urbana e promoção de investimentos em competitividade e desenvolvimento5.

A normativa citada acima informa que o contrato de cessão onerosa de direito à nomeação será precedido de procedimento licitatório para seleção dos interessados, mediante critérios previamente estabelecidos pelo órgão cedente, observadas as normas sobre contratações públicas.

Ocorre, contudo, que há aspectos a serem ponderados. Enquanto alguns defendem que esse é um jogo de ganha-ganha, a preocupação de outros é que tal negócio jurídico privilegiaria o interesse particular em detrimento do interesse público. Nesse seara, o naming rights também poderia configurar ofensas à identidade e história dos bens públicos.

Salienta-se, ainda, o caráter específico da legislação acerca de bens públicos no país, a qual tende a ser tratada de formas diferentes nos diferentes entes públicos nacionais, resultando em peculiaridades regionais e locais que devem ser levadas em conta.

Parâmetros para atenção ao interesse público

Nesse cenário, a cessão dos naming rights parece ser mais um instrumento jurídico que pode ser utilizado pela Administração Pública a fim de captar mais recursos. Destaca-se, contudo, que a utilização de tal instrumento deve ter em conta a atenção ao interesse público, sob pena de se configurar uma privatização indevida dos espaços públicos.

Inicialmente, parece devido que o ente público que pretenda realizar cessões de naming rights, elabore legislação acerca do tema, a fim de ajustar a temática ao crivo da vontade popular, representada em sua casa legislativa, bem como definir os parâmetros devidos para que se atenda ao interesse público.

Por conseguinte, destaca-se que parece ser imprescindível que a escolha da empresa seja realizada por meio de processo licitatório, que assegure os princípios da impessoalidade, da isonomia, da moralidade, dentre outros.

Além disso, a preservação do nome original (proibido a supressão de nomes, autorizando apenas o acréscimo) parece ser medida adequada para assegurar o interesse público na preservação da memória e história dos espaços e equipamentos públicos.

Também entende-se devido o estabelecimento de prazo de duração razoável para o negócio jurídico, a fim de impedir a consolidação de nomes de empresas e produtos privados em espaços públicos. Ainda, a definição de uma contrapartida proporcional à projeção daquele bem público parece fundamental.

Por fim, mas não menos importante, considera-se mais alinhado com o interesse público que eventuais anúncios, placas, estandes e intervenções que se fizerem no espaço público sejam previamente delimitados, de forma que não interfiram, nem impactem de forma desproporcional o uso daquele lugar.

Interessante notar que o art. 11, da Lei nº 8.987/95, que dispõe sobre a concessão e permissão da prestação de serviços públicos, dispõe que no atendimento às peculiaridades de cada serviço público, poderá o poder concedente prever, em favor da concessionária, no edital de licitação, a possibilidade de outras fontes provenientes de receitas alteranativas. Muito embora tal dispositivo trate do âmbito das concessões de serviço público, sua finalidade aponta para os benefícios que se podem trazer na exploração de receitas alternativas.

Portanto, a cessão de naming rights, em nível principiológico, promove a eficiência, ao explorar um bem (o nome daquele espaço) que anteriormente possuia ociosidade em sua capacidade econômica6. De outro lado, porém, sua utilização deve atender aos demais princípios constitucionais, bem como a legislação sobre o tema.


  1. JUSTEN FILHO, Marçal. A exploração econômica de bens públicos: cessão do direito à denominação. Rio de Janeiro: Revista de Direito da Procuradoria Geral, 2012. p. 219 e 220. ↩︎
  2. Chame-me pelo seu nome ou mantenha o meu? Naming rights em bens públicos e em bens protegidos. Eduarda Vilela; Mariana Avelar. Disponível em: https://www.auloteca.com.br/chame-me-pelo-seu-nome-qual-e-o-regime-juridico-da-cessao-do-direito-a-denominacao-naming-rights-em-bens-publicos-e-em-bens-protegidos/ ↩︎
  3. A febre dos ‘naming rights’: por que empresas gastam milhões para dar nomes a estádios e casas de show. 23/03/2024. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/midia-e-marketing/noticia/2024/03/23/a-febre-dos-naming-rights-por-que-empresas-gastam-bilhoes-para-dar-nomes-a-estadios-e-casas-de-show.ghtml ↩︎
  4. Prefeitura de SP recua com “Largo da Batata Ruffles”. João Nakamura. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/economia/negocios/prefeitura-de-sp-recua-com-largo-da-batata-ruffles/#goog_rewarded ↩︎
  5. Lei Municipal nº 3.164/2024 de Juara/MT ↩︎
  6. MOREIRA, Vitor Gomes. Naming Rights de Bens Reversíveis em Concessões Públicas. Revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, São Paulo, n. 97: 34-48, jan/jul. 2023. ↩︎

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